Educar crianças
em tempos difíceis. Esse é o mote inicial para trazer Makarenko, grande
pedagogo nascido na Ucrânia em 1888, às reflexões sobre desafios e
possibilidades do trabalho pedagógico nos Institutos Federais de Educação,
Ciência e Tecnologia. Indagações e dificuldades encontradas por esse grande
educador frente à educação de adolescentes e jovens em situação de desamparo
social, abandonados, alguns com histórico de delinquência, guardam semelhanças,
mesmo considerando a relatividade histórica e cultural, com as apresentadas
hoje pelas escolas brasileiras. Dúvidas
sobre como educar para as quais Makarenko buscou respostas ainda se fazem
presentes não só no Brasil, especialmente como formar pessoas menos
individualistas, colaboradoras, solidárias, responsáveis pelo bem-estar
coletivo, capazes de saber a sério o significado de grupo, do viver em
sociedade. Da mesma maneira, dúvidas sobre como saber se a tarefa de educar se
faz acompanhar de muita complacência ou sobre o equilíbrio a ser guardado entre
liberdades e limites. O fato é que Makarenko conseguiu ser reconhecido
mundialmente pelos êxitos alcançados no seu trabalho pedagógico, apesar dos desafios
e dificuldades decorrentes das grandes transformações históricas do fim do
século 19 e do começo do século 20, revolvidos por movimentos revolucionários, pela
Primeira Guerra Mundial e pela revolução de outubro de 1917 da qual emergiu a
União Soviética. Para a obra educacional à qual Makarenko se consagrou,
especificamente, os desafios e dificuldades advindos da existência no início da
década de 1920, na Rússia, de sete milhões de crianças de rua, sobreviventes à
guerra civil. Interessados no sucesso dessa revolução se perguntavam sobre o
tipo de ser humano a ser formado para viver na nova sociedade e no novo mundo.
Dentre os consensos, a importância de garantir a formação de pessoas com capacidade
de dirigir a própria vida e de contribuir com o desenvolvimento do país, de
participar da organização coletiva e democrática da nova sociedade a ser
construída, o que, sem dúvida, significava dispêndio de muita inteligência, disciplina
e trabalho. Para tanto, Makarenko se engajou com audácia e coragem na criação
de um sistema pedagógico e de conceitos educacionais inovadores. Com isso, destruiu
cânones estereotipados e tradicionais de educação por meio de uma experiência
social e pedagógica concreta e fora do comum, cujo alicerce consistia na organização
de uma vida coletivista socialmente significativa para seus alunos adolescentes
e jovens. Ele partiu do pressuposto de que a fonte de muitos problemas educacionais
se encontrava na presunção da responsabilidade unilateral dos educadores sobre
os alunos, da influência dos mais velhos sobre os mais jovens, da educação como
assimilação de experiência social pronta, da aprendizagem como consumo de bens
espirituais e materiais. Para tanto, apoiou-se em conhecimentos e reflexão
pedagógica desenvolvidos na sua trajetória de formação e profissional. Aos 17
anos, já havia concluído o curso de Magistério. No Instituto de Professores de
Poltava, cidade da Ucrânia Central, teve seu trabalho de conclusão de curso
superior sobre A Crise da Pedagogia Moderna aprovado com distinção. O princípio
educativo do trabalho – que é também um conceito basilar da concepção pedagógica dos Institutos
Federais, no Brasil – deu o norte para o desenvolvimento da sua proposta
educacional. Para tanto, Makarenko se referenciou nas leituras de Marx. Entendia-o
como a base estruturante da pedagogia centrada no trabalho cooperativo, na
cultura tecnológica e no aluno como sujeito social e histórico participante da
elaboração de uma sociedade fraterna. Na sua compreensão, a formação
profissional do aluno se faz na vida real e isso exigia uma metodologia de
educação criativa coletiva, tendo em vista tornar o aluno um participante ativo na
vida escolar. Do início ao fim dos estudos, o educando deveria aprender essa
criatividade social coletiva. Coletiva porque planejada, elaborada, executada e
discutida por educandos e educadores, companheiros mais novos e mais velhos, em um
cuidado comum. Criativa, porque, ao planejar e implementar o que é projetado,
avaliando o que foi feito e aprendendo lições para o futuro, todos procuram as
melhores formas, métodos, formas de resolver problemas práticos vitais. Essa
compreensão deu a Makarenko o caminho para o desenvolvimento dos seus alunos em
três aspectos fundamentais: o primeiro, de ordem cognitiva, se refere à cosmovisão,
aos conhecimentos, opiniões, crenças, ideais; o segundo, à vontade emocional
formada por sentimentos, aspirações, interesses, necessidades elevadas; o
terceiro, de caráter ativo, concerne às habilidades, aos hábitos, à
criatividade, aos traços socialmente necessários. Makarenko dirigiu escolas, em
regime de internato, situadas em zona rural, destinadas aos órfãos da guerra
civil, muitos deles com histórico de infração, estruturadas como comunas
cooperativas. Sua mais marcante experiência se deu na Colônia Gorki, de
Lucília Regina de Souza Machado