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segunda-feira, 18 de janeiro de 2021

MAKARENKO, ANTON SEMYONOVICH

Educar crianças em tempos difíceis. Esse é o mote inicial para trazer Makarenko, grande pedagogo nascido na Ucrânia em 1888, às reflexões sobre desafios e possibilidades do trabalho pedagógico nos Institutos Federais de Educação, Ciência e Tecnologia. Indagações e dificuldades encontradas por esse grande educador frente à educação de adolescentes e jovens em situação de desamparo social, abandonados, alguns com histórico de delinquência, guardam semelhanças, mesmo considerando a relatividade histórica e cultural, com as apresentadas hoje pelas escolas brasileiras.  Dúvidas sobre como educar para as quais Makarenko buscou respostas ainda se fazem presentes não só no Brasil, especialmente como formar pessoas menos individualistas, colaboradoras, solidárias, responsáveis pelo bem-estar coletivo, capazes de saber a sério o significado de grupo, do viver em sociedade. Da mesma maneira, dúvidas sobre como saber se a tarefa de educar se faz acompanhar de muita complacência ou sobre o equilíbrio a ser guardado entre liberdades e limites. O fato é que Makarenko conseguiu ser reconhecido mundialmente pelos êxitos alcançados no seu trabalho pedagógico, apesar dos desafios e dificuldades decorrentes das grandes transformações históricas do fim do século 19 e do começo do século 20, revolvidos por movimentos revolucionários, pela Primeira Guerra Mundial e pela revolução de outubro de 1917 da qual emergiu a União Soviética. Para a obra educacional à qual Makarenko se consagrou, especificamente, os desafios e dificuldades advindos da existência no início da década de 1920, na Rússia, de sete milhões de crianças de rua, sobreviventes à guerra civil. Interessados no sucesso dessa revolução se perguntavam sobre o tipo de ser humano a ser formado para viver na nova sociedade e no novo mundo. Dentre os consensos, a importância de garantir a formação de pessoas com capacidade de dirigir a própria vida e de contribuir com o desenvolvimento do país, de participar da organização coletiva e democrática da nova sociedade a ser construída, o que, sem dúvida, significava dispêndio de muita inteligência, disciplina e trabalho. Para tanto, Makarenko se engajou com audácia e coragem na criação de um sistema pedagógico e de conceitos educacionais inovadores. Com isso, destruiu cânones estereotipados e tradicionais de educação por meio de uma experiência social e pedagógica concreta e fora do comum, cujo alicerce consistia na organização de uma vida coletivista socialmente significativa para seus alunos adolescentes e jovens. Ele partiu do pressuposto de que a fonte de muitos problemas educacionais se encontrava na presunção da responsabilidade unilateral dos educadores sobre os alunos, da influência dos mais velhos sobre os mais jovens, da educação como assimilação de experiência social pronta, da aprendizagem como consumo de bens espirituais e materiais. Para tanto, apoiou-se em conhecimentos e reflexão pedagógica desenvolvidos na sua trajetória de formação e profissional. Aos 17 anos, já havia concluído o curso de Magistério. No Instituto de Professores de Poltava, cidade da Ucrânia Central, teve seu trabalho de conclusão de curso superior sobre A Crise da Pedagogia Moderna aprovado com distinção. O princípio educativo do trabalho – que é também um conceito basilar da concepção pedagógica dos Institutos Federais, no Brasil  deu o norte para o desenvolvimento da sua proposta educacional. Para tanto, Makarenko se referenciou nas leituras de Marx. Entendia-o como a base estruturante da pedagogia centrada no trabalho cooperativo, na cultura tecnológica e no aluno como sujeito social e histórico participante da elaboração de uma sociedade fraterna. Na sua compreensão, a formação profissional do aluno se faz na vida real e isso exigia uma metodologia de educação criativa coletiva, tendo em vista tornar o aluno um participante ativo na vida escolar. Do início ao fim dos estudos, o educando deveria aprender essa criatividade social coletiva. Coletiva porque planejada, elaborada, executada e discutida por educandos e educadores, companheiros mais novos e mais velhos, em um cuidado comum. Criativa, porque, ao planejar e implementar o que é projetado, avaliando o que foi feito e aprendendo lições para o futuro, todos procuram as melhores formas, métodos, formas de resolver problemas práticos vitais. Essa compreensão deu a Makarenko o caminho para o desenvolvimento dos seus alunos em três aspectos fundamentais: o primeiro, de ordem cognitiva, se refere à cosmovisão, aos conhecimentos, opiniões, crenças, ideais; o segundo, à vontade emocional formada por sentimentos, aspirações, interesses, necessidades elevadas; o terceiro, de caráter ativo, concerne às habilidades, aos hábitos, à criatividade, aos traços socialmente necessários. Makarenko dirigiu escolas, em regime de internato, situadas em zona rural, destinadas aos órfãos da guerra civil, muitos deles com histórico de infração, estruturadas como comunas cooperativas. Sua mais marcante experiência se deu na Colônia Gorki, de 1920 a 1928. Na obra Poema Pedagógico, ele a relata. De 1928 a 1936, dedicou-se a outro desafio também muito importante, a direção da Comuna Dzerjinski. Registrou suas ideias e vivências em diversas produções escritas, dentre as quais, além da citada acima, O Livro dos Pais, Conferências sobre Educação Infantil e As Bandeiras na Torre são as mais conhecidas dos educadores brasileiros. Seus princípios e convicções serviram e servem de inspiração a diferentes correntes do pensamento pedagógico. Além de terem passado pelo crivo prático, possibilitaram transformar centenas de adolescentes e jovens marginalizados em cidadãos, repensar o papel da escola e da família e a elaboração das bases da pedagogia social, institucional e mútua. As obras de Makarenko foram traduzidas para quase todas as línguas dos povos do mundo. Em resumo, seus princípios pedagógicos são os seguintes: a) a educação não é uma transferência aleatória de experiências acumuladas, mas a organização criativa e coletiva da vida e das atividades comuns de educandos e adultos; b) a organização escolar tem sua base no coletivo e esse não significa massificação e despersonalização do aluno, mas, antes, a estrutura estimuladora do seu desenvolvimento individual; c) a influência decisiva do coletivo sobre a formação individual precisa ser exercida por relações socialmente significativas e não puramente emocionais; d) a vida comunitária se constrói na preocupação comum, na superação das dificuldades comuns, no compromisso com o trabalho comum; e) a sobrevivência de cada um depende do trabalho de todos, da solidariedade, da preocupação com o outro; f) cada educando tem seu direito de opinar e se manifestar e de preservar sua individualidade; g) a relação entre o mundo exterior e interior à escola é indissociável, por isso, a família deve ter participação na escola; h) o educando precisa viver a realidade concreta, ter contato com a sociedade e com a natureza, participar das decisões sociais; i) a forma de organizar o coletivo deve decorrer das necessidades mesmas do coletivo; j) normas e decisões não são predeterminadas; k) o primeiro e o último voto devem ser sempre dos alunos; l) o papel de líder de cada equipe deve ser assumido por todos de maneira rotativa, assim se formam lideranças; m) cada educando precisa ter total clareza sobre suas responsabilidades; n) o trabalho manual deve ser assumido por todos; o) a disciplina é fundamental para que a vida em comunidade dê certo; ela não é um fim em si mesmo; p) a aprendizagem deve ocorrer sem coação, guardando unidade entre respeito e exigência; q) não está descartada a possibilidade de punição caso o coletivo assim o decida com base em análise concreta e participativa da situação em questão; r) a cada novo aluno que chega à escola, é preciso recebê-lo com este dizer: “Não queremos saber coisas ruins sobre você. Uma nova vida começa!"

Lucília Regina de Souza Machado